terça-feira, 18 de outubro de 2016

Vento do Norte

Com o advento dos nebulosos dias de Outono,
Vieram juntas as memórias de antanho,
De infâncias minhas e dos meus,
Revolvendo os pensamentos e ideias.
Vou discorrendo o correr do tempo, da vida,
Repleta de alegrias, de tristezas, de melancolias,
De melodias doutros tempos,
Cantaroladas enquanto os rebentos adormecia,
De histórias de encantar, para seus encantos,
Relembrando aqui e ali, os meus próprios desencantos,
Fruto de decisões, de esperanças e ilusões,
Que sem eira nem beira, ao longo do tempo,
Vou questionando as razões do seu efémero assento.
Decerto foi por amor a vós, frutos do meu sémen,
Esperando o reencontro da razão da árvore plantada.
Mas o tempo é inexorável, não colhe ervas secas,
De afectos que não sobraram, só a labuta da minha ceifa.
Vai chovendo, e vão as nuvens cobrindo a luz,
Do sol que tarda em aquecer, corações frios e almas molhadas.
As estações nem sempre são constantes,
Na inconstância de tantos seres, em que hoje um sorriso brota,
Amanhã um esgar rugoso da testa, apreensivo e cinzento,
Como se o caminho de suas vidas, feito num labirinto,
Se deparem em cada esquina, e em cada momento,
Encruzilhadas e ruas incógnitas, no sentido e declive,
Umas vezes avançando rápido, seguindo o coração,
Outras recuando de seguida, dando voz aos pensamentos,
Soltos, adversos e inconstantes, ao sabor da brisa,
Ou do vento do norte que assola, e tolda o coração!


domingo, 21 de agosto de 2016

AMOR PERFEITO

Podia ser uma rosa,
Que qualquer principezinho,
Encantado ou feito marionete de trapos,
Sem pretensões a ser rei,
Dedicaria todo o seu tempo,
Regando-a e cuidando de seus espinhos,
Vendo-a crescer junto ao seu jardim.
Ao principezinho apenas lhe importava,
Esse belo e lindo jardim onde ela florescia,
O aprumo do seu palácio se seguiria,
No tempo oportuno e marcado,
Segundo as leis do regedor mor,
Para assim melhor a acolher.
Mas para mim, que agora escrevo,
É, mais que todas as outras flores,
O meu amor-perfeito, o mais lindo e único.
Não perfeito em todos os detalhes,
Que só na natureza há perfeição,
Mas é nesses pequenos detalhes,
Que despertam os nossos sentidos,
Toda a nossa aventura,
Da evolução e crescimento dos seres,
Se possível juntos... pensamos às vezes.
A áurea maior desse amor-perfeito,
A externa e visível a todos que a rodeiam,
Num carmim suave e doce como o seu rosto,
Não mais representam que a sua grandeza,
De mulher plena na sua natureza,
Buscando incessantemente forças,
Para amparar no seu colo os seus,
A sua vida e os outros que a procuram,
Numa imensidão que a esgota, mas perdura.
É a mais arredondada e mais lisa,
Ou não fosse o amor maternal o seu presente,
A sua dádiva dos deuses
E a todos superior.
Na do meio, de jasmim colorida e perfumada,
Sobressai a luminosidade do seu interior,
Rica e transparente nos sentimentos que afloram,
Nos sopros de esperança que procura transmitir
Aos outros, aos pedintes e menos favorecidos,
E mesmo aos que tudo julgam já ter, mas não são ainda.
Queira Deus que esse sopro de esperança,
Consiga deixar que se transmita a si mesma.
A outra áurea, a mais interna e intensa,
Que se abre como a lava dum vulcão,
Pertence à outra dos sentimentos,
Mas onde as suas emoções explodem,
E apenas verdadeiramente visível e acessível,
Aos que tiveram esse privilégio,
E a souberam enaltecer.
Tem a forma e os lábios de onde brotam,
Toda a sua sensualidade de mulher amante,
Da volúpia intensa onde o mel transborda por inteiro,
Do primeiro ao último momento do seu êxtase,
Carnal, infinito e sem mácula ou preconceito,
E onde o céu e o paraíso se fundem bem alto,
Pairando enquanto o tempo não tem medida,
Repousando depois de toda a sua exaltação,
Numa praia, que era só deles enquanto partilhada,
Ou no areal deserto doutros sonhos.
As raízes, essas, são feitas dos seus valores,
Dos seus princípios que continuam crescendo,
Resistentes no que já são, e vontade de querer,
A seiva que lhe vai fortalecer sempre,
Quando as inconstâncias e caprichos,
Ou as intempéries da vida a mais fragilizam.
Seja rosa, jasmim, girassol,
Ou simples flores silvestres,
Que crescem à beira daquele ribeiro manso,
Onde caminham e se estendem num verde manto,
Os corpos ardentes dos amantes,
Será sempre aquele amor-perfeito,
O mais lindo em toda a sua plenitude,
Que já vi e que, com ternura,
As suas pétalas afaguei
Naquele primeiro dia de sol,
E embevecido acariciava,
Sempre que a regava.
Cheirei o seu delicioso perfume,
E o seu doce e quente mel saboreei,
Levado pela abelha-rainha do amor.
Mas, tal como qualquer flor do jardim,
Ou da selva mais recôndita escondida,
E por muito que o fel custe e doa,
E parecer que se morre aos poucos,
Quando se ama como nunca, essa flor,
Não se pode colhê-la, mas deixá-la estar.
Pois o amor não está na posse, mas na apreciação.


(Adriano Costa – 21 de Agosto de 2016)


terça-feira, 26 de abril de 2016

Diz que não meu irmão



Meu irmão, meu amigo,
Nunca te deixes subestimar,
Por nada nem por ninguém.
Nem tampouco te cortem as asas
Dos sonhos, da vontade ou da vida,
Nem prezem o valor que há em ti,
Não sejas depósito residual de outros.
Nem aceites nada pela metade,
Meias verdades são meias mentiras,
São num todo deslisura.
Menos ainda meios amores,
Que de manhã o parecem ser,
E à tarde mostram que não,
Caindo a noite num vazio inútil,
De nada ter, nada ser nem colher.
Acordarás no dia seguinte,
Sem saber com que contar,
Apenas aquela angústia sufocante.
Não mendigues afectos,
Ou atenção e respeito que mereces
(Como qualquer ser humano).
Nem que te coartem as palavras,
(Por mais banal a conversa)
Quando a vontade não é ouvir-te,
Mas apenas te contradizerem
Para justificarem seus instintos.
E se algum dia alguém te abandonar
Mesmo que por algum erro teu,
Isso meu irmão, meu amigo,
Não foi mais que uma desculpa
P’ra te descartar e ficar de consciência limpa.
Muito menos esperes humildade,
Que não se mede apenas em palavras,
Mas nas atitudes que as acompanham.
Não aceites migalhas meu irmão,
Não corras por quem não te procura,
Nem por quem não chama por ti.
Deste de peito aberto o que há em ti,
Se amares demais não te importes,
Desde que não percas o teu ser.
Fizeste a tua parte, foste tu,
Inteiro, íntegro e impoluto.
Meu irmão, meu amigo,
Não te consumas com intrigas,
Enredos e implicâncias
Que são de outros que não teus,
O teu mundo não é esse,
Não são feiras de vaidades.
É simples e escorreito,
Na autenticidade dos sentimentos,
Como quem tão bem te conhece
O reconhece e valoriza.
Isso, meu amigo,
É o mais importante
E que fica intacto no final.


(Abril 2016)