quinta-feira, 9 de agosto de 2012

QUANDO BATE A SAUDADE

Peculiar palavra que tanto exprime
O que vai na alma num momento
De lembrança fugaz ou teimosa
Que tanto pode ser de alento
Como de um longo tormento.
Decerto só a sente
Quem a alma tem quente
Naquele nó permanente
Cá bem dentro de nós
Que suspende a respiração.
Por vezes solta um suspiro
Outras, lágrimas em torrente,
Torna o peito ardente
Num fogo que alastra dormente
Nos olhos um brilho presente.

Saudade tantas vezes de ti meu velho
Que como num porto de abrigo aportava
Que tão bem os valores e princípios
Soubeste transmitir com teu exemplo,
Que em teus últimos momentos
Cobertos de dor e lamentos
Peguei em ti feito uma criança.

Saudades de vós quando rebentos
Daquelas horas ao adormecer
Contando histórias de fadas e príncipes,
Ou da fábrica de brinquedos
De chocolates e ilusões,
Cantarolando canções de embalar.

Saudades de ti e de ti
Ou daquele outro ou outra
Quantos sonhos feitos e desfeitos
Quantos projectos cumprimos
Outros ficaram pelo caminho
Mas seguimos nossos rumos
Sem mágoas, antes sorrindo.

Saudade que bateu naquela esplanada
Chegou bem de mansinho
Como querendo passar despercebida
Ao lembrar-me de ti num repente
Podias estar ali também, seria bom
Saboreando aquele final de tarde
A saudade assim é estranha, ou talvez não
Como a lembrança duma simples partilha
No gesto simples em comermos do mesmo prato,
Rindo dos olhares alheios.
Ou descansar deitados na relva,
Contemplando aqueles patos patudos.
É assim espontânea, desprendida.

Saudade não é saudosismo
É diferente, é sentimento
É saudável e é presente
O outro é passado que persiste
Que tolda a mente e não avança
Doentio e perverso
Não tem sentido nem nexo
Mantém o corpo prisioneiro
De uma mente perdida no deserto.
Quando bate a saudade
Não é como o sino a bater
Naquela torre da igreja
Saudade não tem hora
Bate a qualquer instante
Imprevista sem saber ao que vem.


sábado, 4 de agosto de 2012

LIBERDADE

3-08-2012

A que preço se pode viver
Se pode sentir e ter
Todo este sentimento
Toda esta plenitude
Que uns morrem para a ver
Outros matam em seu nome ?
Recuso apenas usufruir
A liberdade de pensamento
Prisioneira de cada mente
Algumas dementes
Outras arrogantes
Outras ainda vazias
Prefiro a cabeça erguida
Mesmo se para tal
Me impedirem a vida.
Recuso a arte de quem a quer
Sem olhar para o seu lado
Outro ser desprotegido
Espezinhado e marginalizado
Animal ou humano
Em que tão distantes estão
Os actos e gestos solidários
Que para um a ter
Outro fica despido.
Recuso a liberdade
Que permite o maltrato
De outro igual rico ou barato
Recuso a liberdade
Que dentro de casa
Ousa infligir a face o corpo
A mente ou a dignidade
De quem quer que seja.
Recuso a liberdade
Do desprezo e desconfiança
Que humilham e desvalorizam
A grandeza doutro ser.
Liberdade é amor
Como o amor é liberdade
De dar e aceitar
Aquilo que se é
E aquilo que se quer ser
Livremente num todo.
A liberdade tem um espaço
À minha e à tua volta
Que não ouso tocar
Pelo respeito do teu espaço
Do teu tempo e do meu.
Mas sou livre de sonhar
Sou livre de discorrer
De contradizer
E de contrariar
Sem perder a liberdade
Da minha paz de espírito
Se a razão de outra voz
O interesse não merecer.
E sou livre de correr
Pelos prados e planaltos
Por montes e vales
Saborear os salpicos frescos
Que saltam na praia estendida
Trazidos pelo vento e pelo mar.
Liberdade rima com responsabilidade
De ser acompanhada
Por gestos e actos
Que a definem mais que a palavra.
Liberdade rima com vontade
De fazer o pino na rua
De subir àquela árvore
Ou rir às gargalhadas
Sem receio da crítica mordaz.
A liberdade respira-se
Bem cá dentro de nós
Está na alma e no sangue
Que corre e dá vida
Livre de si mesmo
De seus medos e anseios
Solta-se por vezes em prantos
De lágrimas sofridas que explodem
Em dores e lutas inglórias.
Mas vale a pena o suor
Para que a liberdade
Não seja uma palavra vã
Limitada ao meu ser.



quarta-feira, 1 de agosto de 2012

PEDRA PRECIOSA

01-08-2012

Por entre as águas calmas do rio
Onde os golfinhos correm sorrindo
As pedras rolam e desenrolam
Ao sabor da corrente sem ondas
Em bonança serena como dois braços
Que se abrem de mãos estendidas
Convidando à vida e à vontade
Espraiando-se nas margens estendidas
Largando areias e pedras soltas
Que vão ficando ao ar resistindo
Formando um caminho, um oásis
Onde pés descalços repousam
Sentindo e calcarroeando as pedras
Como suave manto de veludo.
No meio das pedras e seixos rolados
Uma brilha resplandecente e viçosa
Em tons lindos e coloridos
Combinados entre si a preceito
Num arco-íris sob o azul que a cobre.
Delicada, doce e formosa
Esta linda pedra preciosa
Tem nela uma vida constante,
Vira e revira num frenesim
A tudo e todos acode sem fim.
Suas faces e linhas torneadas
Não precisam mais ser polidas
Antes cuidadas e mimadas,
Com a delicadeza própria dum ser
Que tem no rosto um sorriso
Largo, alegre e desprendido
 Que ri, dança e corre
Que impede uma lágrima teimosa
De soltar-se de seus olhos.
Sim, tem vida e tem olhos
Esta pérola, rubi ou opala,
Como duas pequenas azeitonas
Rasgadas e semi-cerradas
Quando o cansaço a toma,
Tão dengosa e doce que fica,
Que terna imagem se torna,.
Pelo rio se solta e desprende
Corre pelo oceano adentro,
Dando a volta à enseada
Torna a surgir esplendorosa,
Dando à vida alegria e sentido,
Que duma pedra tão preciosa
Se  transforma numa bela jóia
Tão natural e maravilhosa,
Na simplicidade de sua grandeza.